areia

por Marcelo Frizon

mfrizon@uol.com.br

1

Estava sentado observando o horizonte. Considerava aquela paisagem uma das mais belas do mundo. Não que fosse um homem viajado, mas aquele lugar lhe dava paz, um certo alívio como nenhum outro. Era no alto de um morro. O céu estava tão limpo que não havia nuvens e o sol brilhava tanto que deixava a água do mar transparente.

Não, não pensava em nada. Só estava observando o mar e o céu, as aves e as plantas. Ele poderia pensar no suicídio, como fizera tantas vezes, e ali seria um ótimo lugar para passar para o próximo estágio: era alto e bonito. Mas não, não pensava.

Um pássaro pousou ao seu lado. Era bonito, não sabia qual a raça, se é que aves têm raças, pensou. Mas era bonito. Amarelo. Cor da amizade. Cor do ouro, do dinheiro. Essas imagens lhe lembraram o afastamento dos amigos, os problemas da empresa, a ganância da ex-mulher. Agora já pensava, e isso não lhe dava alegria. Pensar em coisas materiais era algo de que não precisava naquele momento.

Tratou de esquecer logo e voltou a observar o mar e o céu, as aves e as plantas. Mas o pássaro continuava ali, como se estivesse lhe dizendo que não adiantava fingir, os problemas existiam e ele devia encará-los.

Uma mulher sentou-se a alguns metros dele no mesmo momento em que o pássaro levantou vôo. Ela usava um vestido branco transparente, como a água do mar, e isso lhe trouxe a paz de volta.

- O melhor lugar do mundo, não?! – ela disse, sem olhar para ele.

- É - ele respondeu, meio atrapalhado.

- E o melhor lugar do mundo para morrer, não é?!

- Também – respondeu, desta vez assustado.

- Você já pensou muito nisso, não é?! Eu também penso.

Desta vez ele não respondeu. Ficou parado - olhando o quê? Ela se levantou, veio até ele e ofereceu sua mão. Depois de olhar para a mão, para o rosto, estendeu a sua.

- Vem – ela disse.

2

Passaram por lugares que ele não conhecia. A presença da mulher lhe fazia bem, apesar de sentir algo estranho, algo que ele não conseguia controlar.

No final da tarde, foram para sua casa. Foi ao banheiro. Ela foi atrás. Entraram vestidos no chuveiro e aos poucos foram se livrando das roupas. A água escorria por seus corpos, que iam sendo descobertos com paciência e prazer. Depois de nus, veio o abraço. Um abraço forte, demorado, momento em que ele pôde rir e chorar, pensar e sentir tudo que precisava.

Saíram do banho e ela não o esperou: foi para a cama. Se deitou ainda molhada e ficou lhe esperando. Ele parou na porta do quarto e ficou observando aquela perfeita simetria entre curvas delineadas, pêlos loiros do sol, leves estrias e cabelos molhados e desarrumados. Se deitou ao lado dela: ria e chorava, pensava e sentia.

Dormiu.

Acordou com o sol batendo na sua cara. Deu conta de que dormiu demais, mas aquilo era bom, era disso que precisava há muito. Não, não esperava que ela estivesse ao seu lado. E não estava.

Olhou para a praia e notou um aglomerado de pessoas perto do morro. Pareciam carregar uma mulher de vestido branco transparente. Coberta de areia.