UM PROMISSOR "TREINADOR DE FUTEBOL"

por Joaquim Inácio

Pois sempre fui um entusiasta de futebol. Ainda piá, lá pelas bandas de São Lourenço do Sul, formei meu primeiro time com a gurizada da zona, o "Colorado" (nem sei por quê!), que tinha um centroavante de nome Laone, um negrinho habilidoso que buscava a bola na defesa e saía driblando todos até fazer o gol. Quando ele passava a bola para mim (afinal eu era o "dono do time e da bola"), eu a perdia logo e, aí, era aquela correria dos demais para recuperá-la.

Convenci-me que eu era, realmente, um "cabeça-de-bagre" e, já naquela época, optei por "treinar" o time. Aí o "Colorado" deu certo, não tanto por meus méritos como técnico, mas por causa de minha saída do time... Chegamos a disputar um torneio no campo do São Lourenço e ganhar o vice-campeonato.

Desde então, continuei tentando jogar nos colégios ou nos clubes recreativos que freqüentava, mas, fatalmente acabava sendo "promovido" a técnico. Minha função principal era escalar os times (desde que os jogadores concordassem!) e pegar a bola para repô-la em campo.

Mas não desisti, continuei minha "brilhante carreira futebolística" até à idade adulta. Na AABB de Porto Alegre eu jogava "peladas" com os colegas e organizei um time que, por motivos óbvios, demos o nome de "Os Pernas-de-Pau"... Nesse eu tinha lugar garantido, até que estourei o joelho direito numa dividida e tornei-me o inefável "treinador"!

Fui trabalhar em Brasília. Meu primeiro time foi o "MIC" (formado por funcionários do Ministério da Indústria e do Comércio). Um sucesso. Tinha um goleiro gaúcho, alemão de Novo Hamburgo (Anshau), um meio campo mineiro cheio de manhas (Guilherme), alguns cariocas e, entre eles, acreditem, o Ademir Menezes – "Queixada", aquele cracão do Vasco dos anos 50/60. Jogava com dois zagueiros e um "cabeça-de-área" plantado no meio. Minhas ordens eram de que, os três, não ultrapassassem o meio do campo (a linha divisória, claro), pois os adversários jogavam com "enxertos" dos clubes profissionais da região que eram muito velozes. Com esse esquema, nunca éramos pegos de surpresa em contra-ataques e a bola voltava para o campo adversário.

Esse time do MIC, inspirado nas táticas do saudoso Teté, inteligente e tranqüilo treinador do Internacional, chegou a ganhar um torneio interministerial, com a presença de ministros, taças, prêmios, etc...

Nessa época, começava a ganhar espaço nos clubes o "Futebol de Salão", depois designado Futsal. Aí achei que era a minha hora de voltar a jogar, pois, assistindo, me parecia bem fácil. Um campo pequeno, tênis, dois ou três passes e lá estava o gol pedindo para ser marcado... Ledo engano. Muito mais difícil! Entrava na cancha e ficava tonto, às vezes nem via onde estava a bola. Resultado: voltei a ser treinador...

Primeiro organizei um time juvenil, chamava-se "Rastapé", com base em dois filhos meus que, "imparcialmente" eram sempre escalados como titulares. Adotei um esquema que vira no time de futsal do Internacional (pra variar...): um fixo atrás e um na frente, ocupando os espaços de defesa e ataque, e dois alas que corriam o campo todo, pela esquerda e direita. Novamente "me dei bem", pois os adversários não entendiam como eu conseguia colocar tanta gente, tanto no ataque, como na defesa. O Rastapé sagrou-se campeão juvenil da AABB-Brasília e tornou-se um time de tradição naquele clube.

Como continuava trabalhando em ministérios, parti para um time de Futsal adulto, o GEMUD, que era um departamento da Secretaria de Planejamento da Presidência da República. Outra vez o "jogador frustrado", mas já "treinador consagrado", conseguiu surpreender (com jogadores medianos, mas um esquema igual) às demais secretarias e departamentos da SEPLAN, vencendo um torneio, que durou meses, invicto.

Eis que, voltando ao BB (Banco do Brasil), fui parar na África – Abdijã, Costa do Marfim – onde o futebol também é uma paixão. Certo dia, jogando futebol na areia das belas praias africanas (onde, claro, chutei mais "areia" do que bola!), percebi que alguns colegas nativos (negros africanos) tinham habilidades na condução da bola. Pronto. Lá fui eu organizar um time do Banco e passei a treinador internacional (não do Internacional!).

Começamos a treinar, conhecer melhor as posições em campo dos colegas, organizar táticas de jogo, cobranças de faltas, escanteios, cabeceios, pênaltis, etc... Quando achei que estávamos preparados, marquei um jogo com um time da colônia libanesa que, segundo diziam, eram os campeões amadores da cidade.

No dia do jogo, um domingo ensolarado africano a 40° C, "dopei" meus jogadores com uma dose efervescente de glicose, fiz a preleção e, quanto me preparava para escalar os onze que começariam o jogo, meu camisa 11 – Doko – pediu para não jogar alegando indisposição. Mas ele já tinha trazido seu "pétit-frère" - termo que os marfinianos usam para designar seus afilhados ou protegidos – que era um excelente atacante pela esquerda e jogava melhor do que ele.

Olhei em volta e, vendo um sinal de aprovação dos demais, lhe entreguei a camiseta. Mas não mudei a planilha (tinha árbitro, bandeirinhas e tudo o mais...). O indicado jogaria como se fosse o Doko.

Começamos bem o jogo. Os africanos eram magrinhos, de pernas finas, mas muito ágeis na condução da bola. Só que perdiam as divididas para os musculosos e pesadões libaneses. Aí levamos um gol de fora da área (o goleiro estava adiantado, que nem o Hiran) e eu mandei o time para frente (Avant, avant tout le monde!).

Foi aí que o "Pétit-frère" recebeu uma bola aprofundada na esquerda e saiu driblando a todos. Driblou, passou por um, por dois, por três, mas seguiu driblando e passou com a bola dominada pela frente do gol, indo perdê-la, logo a seguir, já na linha de fundo direita do nosso ataque...

Não agüentei: peguei a bola reserva e, com o jogo em andamento, joguei-a para o negrinho! "Prend ce ballon" (tome esta bola!), gritei. Ele ficou todo atrapalhado, mas tomou uma decisão: chutou-a para o gol e entrou!

Como resultado, nosso "Pétit-frère" e eu fomos expulsos. O time do BB perdeu por 2 X 0 e, aí, encerrei minha carreira como técnico de futebol....

Hoje me limito a assistir jogos, principalmente do meu time do coração, o Internacional. Critico, vejo as falhas, dou palpites, mas continuo inativo.

Mas, se o Zé Mário, por acaso, não se sair muito bem – Estou por aí!