TEMPO
por Bernardo Turela
bturela@yahoo.com.br
 

O tempo é a sucessão de marcas memoriais cerebrais. Quanto mais longo parece ser o tempo, mais momentos consecutivos gravados. Assim, sendo o tempo variável, pode-se tanto acelerá-lo, através de uma "distração" absoluta, ou seja, não deixando marcas cerebrais que não serão "lembradas" de terem existido, tornando nulo o tal momento "não-anotado", ou acelerá-lo de tal forma a guardar mais momentos e como que frear o movimento cósmico, a energia da vida, a AÇÃO do universo. Pode-se frear isso, o tempo, absolutamente, incapacitando-o de criar um novo momento antes de mais captações do mesmo momento pelo cérebro. Eu, caio de um avião. Fui jogado de lá. Amarrado e sem pára-quedas. Um cérebro especial poderia ser tão rápido, ter tantos neurônios trabalhando por toda sua extensão de forma tão ordenada que conseguiria captar tantos detalhes, gerar tantos pensamentos em tão pouco tempo que o tempo simplesmente não conseguiria penetrar entre uma e outra fatia de memória. Estou no céu. Vejo uma porção um bocado grande do estado. Uma concentração absoluta conseguiria estabilizar o pensamento, regrar as pequenas aranhas elétricas para que se ligassem uma na outra unanimemente. Grandes cidades cabem no meu campo de visão. Se meus olhos não tivessem essa frouxa capacidade, poderia obter incontáveis detalhes de cada pessoa que passasse em cada rua de cada uma das cidades. Numa contagem de lembranças médias colhidas nesse amplo espaço de visão, poderia viver por mais dias, meses. Mas não. Não enxergo o suficiente. Viveria mais algum tempo, mas ainda não viveria para sempre. Não neutralizaria o tempo. Afinal, detalhes não são infinitos. Viver para sempre. Não há suficientes dados disponíveis para catalogar e parar tudo. Há uma solução: um círculo autosuficiente, um loop onde a reduzida velocidade do meu cérebro possa ter um aproveitamento máximo pleno. Há um modo. Concentrar em algo e encará-lo como um novo algo diferente a cada passagem de tempo, a cada nova checagem que a mente faça, vendo-o como o algo acrescentado do que entrou após a passagem, acrescentado da própria passagem. Assim, o tempo é marcado num mesmo objeto. Se o objeto for marcado num tempo e, na próxima lembrança, no mesmo tempo anterior, significa que o tempo não progredirá, mas encontrará seu próprio rabo ao fim de cada passagem. Tenho que ser rápido. Toda minha energia mental direcionada no breu, na escuridão dos olhos fechados. Assim faço para que nada mais aconteça. Para que a queda não exista, para que o tempo não exista, para que eu não exista. Fecho os olhos.  
 
Caio de um avião, e, em breve, nada mais existirá.