MANUAL DE REDAÇÃO DO NÃO

 
É verdade, me lembram, em 23 anos de existência o Não nunca teve um Manual de Redação. Pois agora, depois de uma reunião extraordinária da editoria, provocada pela releitura de algumas das cartas enviadas pelos leitores, resolvemos que essa putaria tinha que acabar.Por exemplo, em 5 de março o leitor Laurício Tissot mandou-nos uma singela cartinha dizendo:

Segue-se um endereço eletrônico, com uma ligação para uma página, temos que reconhecer, extremamente tediosa. Apesar da sinceridade, não gostamos nem um pouco dessa carta e, ao discutir por quê, estabelecemos a primeira regra do nosso manual de redação:

(1) Não anunciarás em vão.

Ou seja: quer aproveitar a fantástica mídia do Não para anunciar o teu produto, o teu serviço, a tua página internética, o teu time de botão, as tuas virtudes sexuais, a tua receita para cura da caxumba? Tudo bem, nós aceitamos - mas em troca de alguma coisa. De preferência, dinheiro - mesmo que isso nos cause o desconforto de ter que criar um departamento comercial. Pra facilitar, também aceitamos outros tipos de mercadorias: CDs importados, pentes de memória RAM, favores sexuais, ou pelo menos um pouquinho de diversão.

A pergunta "você conhece alguma tribo urbana completamente idiota e anacrônica?" não despertou nenhum interesse nem mesmo no mais idiota e anacrônico dos nossos editores, e a frase de despedida "o século 21 será um tédio" foi indicada para o Troféu Alexandre Garcia, categoria "sou idiota mas não sou o único"

Avisamos, portanto, os nossos queridos leitores que, daqui pra frente, cartas como esta não serão mais publicadas, que dirá comentadas. A gente também tem mais o que fazer, pô! Nossos patrões (José Dirceu e o dr. Roberto Marinho, não necessariamente nessa ordem) não estão nos pagando essa fortuna pra gente ficar por aí ensinando vocês a escrever.

No dia 30 de março, um leitor que se assina "Seferis" escreveu:

Ficamos um bom tempo (pelo menos uns 10 segundos) tentando entender o que o leitor estava querendo dizer com isso, antes de desistir. Em seguida criamos a segunda e a terceira regra do nosso Manual de Redação:

(2) O quéco?

(3) Assine o seu pseudônimo.

A segunda regra, explicada bem devagarinho, significa exatamente o seguinte: "o que é que eu tenho a ver com isso?"; ou ainda: "se a gente não souber qual é, não publica".

Já a terceira regra merece ser um pouco mais explicitada: "se você quiser assinar com pseudônimo, tudo bem, mas NÓS precisamos saber quem você é". Quem quiser entrever nessa regra, ainda que sutilmente, algum resquício da velha "lei do dono da bola", pode ter certeza que é isso mesmo.

Mas o verdadeiro motivo para a convocação de nossa reunião extraordinária de editoria foi uma terceira carta, enviada pelo leitor Francisco Eschiletti em 2 de abril. O texto era o seguinte:

A piada (se é possível aplicar aqui esse termo) é bastante antiga: a soma das idades de nossos editores bate perto de 120 anos, e todos garantem que já tinham ouvido essa besteira antes de nascer. Mas o pior é a "contribuição pessoal" que o leitor pensa ter dado ao "atualizar um clássico": em primeiro lugar, escolheu como personagem aquele sujeito que alguns alunos do CMPA andaram elegendo como "a personalidade do século"; ainda por cima, teve o lampejo de criar uma situação dramática para justificar o surgimento do, digamos, trocadilho bilíngüe: situação, aliás, da qual esse tipo de humor nunca deveria ter se afastado.

Sem maiores comentários, recorremos a São Tomás de Aquino e chegamos rapidamente e por unanimidade à formulação da quarta e última regra de nosso Manual de Redação - que, aliás, em caso de emergência pode inclusive substituir as outras três:

(4) Tenha a santa paciência!

Bem, leitores, por hoje é só. (Como a gente sempre insiste em dizer, o Não não tem leitores, daí a esquizofrenia latente da frase, e de todo este texto.) Mas não esqueçam que o Manual de Redação do Não pode voltar a qualquer momento com novas interferências e novas regras, e quem sabe mesmo algumas exceções. Sim, queremos ser como o Luis 14, ou ainda mais, como o Nelson Jobim: executivo, legislativo e judiciário (desde que, pra isso, a gente não precise dividir apartamento com o José Serra).

Mas não deixem de escrever só por causa disso... Ora!

Os editores.