BYE BYE BRASILIEN:

anotações sobre uma primeira viagem à Alemanha.

por Roberto Tietzmann

Visto do alto, o Brasil tem mais em comum com sua bandeira do que se imagina. Boa parte da terra é de um verde sem fim. O céu acima das nuvens é sempre azul. O dourado do sol e o branco das nuvens distantes completa a paisagem. Mal sabíamos que aquela era uma das poucas vezes que veríamos o sol no próximo mês.

Corte seco para o aeroporto de Frankfurt. Ansiedade entre os brasileiros: será que o frio não vai fazer todo mundo virar picolé? Afinal, a mídia no Brasil não cansava de mostrar nevascas e avalanches por toda a Europa! Socorro! E se houvesse uma avalanche nos esperando aqui na porta do aeroporto??

Simpáticos quatro ou cinco flocos de neve nos recepcionaram ao sairmos. Para muitos, foi o primeiro contato com neve e motivo de festa. Incrédulos com a neve feito a platéia da caravana Rolidei em "Bye Bye Brasil", mal imaginávamos que a neve que começou em Frankfurt não nos deixaria tão cedo.

Mesmo os alemães estavam impressionados com a neve. Segundo eles, era a maior dos últimos quinze anos. Um passeio a pé fazia de você um boneco de neve em questão de minutos. Nos pátios das concessionárias, carros cobertos por uma casca de 15cm de neve buscavam compradores. E a paisagem de pinheiros, vales, rios e cidades desenhava-se inteiramente em preto-e-branco.

A curiosidade é que muitos alemães (eles também!) preferem o verão ao inverno. Quando os brasileiros elogiavam a paisagem nevada (e estavam realmente achando tudo lindo), eram recebidos com um sorriso amarelo pelos nativos:

-Obrigado... Mas fica bem mais bonito no verão.

Pelo menos quanto à fotografia de pontos turísticos, eles têm razão. Os cartões postais todos mostram a Alemanha no verão, na primavera... As fotos que sobram para você tirar no inverno em geral são prejudicadas por uma luz não diferente daquelas semanas de chuva do inverno gaúcho. Ou seja, aquele nublado jururu que não dá vontade nem de sair da cama.

Ainda assim, todo turista se porta como um verdadeiro caçador. Ao invés de pousar com o pé em cima do leão morto ou comemorar ao lado do peixe-espada pescado, sorri ao lado de obeliscos, igrejas e túmulos de imperadores. É a sua maneira de proclamar a conquista, de dizer "estive aqui". Sua assinatura sobre a história.

Aliás, a Europa não recebeu o apelido de "velho continente" por acaso ou decreto. O desbunde proporcionado pelas igrejas multicentenárias, casas onde nasceram e moraram personalidades que mudaram a cultura do mundo e pelos lugares onde a "história realmente aconteceu" impressiona até o mais inculto dos brasileiros. É impossível conter um arrepio ao entrar em uma igreja de 500 redondos anos, a idade do Brasil.

Museus como o Pergamon (em Berlim) vão ainda mais longe, e mostram a história da Grécia, Roma e Mesopotâmia. Detalhe: com templos originais remontados em seu interior! Ao dobrar uma esquina do Pergamon... TCHÃ! Lá está um templo grego imenso tim tim por tim tim. Pegando à direita, UAU! Um templo mesopotâmico remontado tijolinho por tijolinho... com a altura de um prédio de uns três ou quatro andares! É mole ou quer mais? Nas prateleiras, cerâmicas e talheres do século IX, bustos romanos, etc. tudo está ali.

Viajar pela Alemanha também é interessante porque toda a matéria de história do segundo grau começa a parecer verdade, e não algo que os professores inventaram só pra tentar rodar você. Existem mesmo cidades medievais rodeadas por muros (como Rothenburg e Nürnberg) com ruelas e castelos de 1000 anos.

Depois de umas semanas vendo isso, você até se acostuma com a idéia de ver castelinhos no topo de cada morrinho. E esse é o momento onde o histórico se torna trivial, cotidiano. De repente até você pensa em dar um descanso para sua máquina fotográfica. Mas, CLIC-VRRR! É melhor fazer a foto agora que se arrepender depois!

Atualmente, Berlim se prepara para assumir todas as funções de capital da Alemanha novamente. Como conseqüência, a cidade está virada em um canteiro de obras. Nas proximidades do portal de Brandemburgo (onde passava o muro) e do Reichstag (de onde Hitler despachava), não há foto possível sem guindastes para todo lado. É impressionante o investimento em moldar a imagem do país reconstruindo monumentos e prédios danificados pela guerra (ainda a segunda guerra mundial) ou apagando os vestígios do regime comunista.

Apesar de reunificada (o muro caiu em 1989, uma semana antes das eleições presidenciais no Brasil, lembra-se?), ainda restam diferenças entre os antigos lados ocidental e oriental da Alemanha. Os do oeste olham para o leste com um certo topete levantado, como o "primo rico" olha para o "primo pobre" nos textos de Max Nunes. Curiosamente, o diálogo entre os brasileiros e os alemães do leste tinha muitos pontos em comum.

De uma certa (e engraçada) maneira, estávamos unidos no espírito do "primo pobre". Tanto os do leste quanto os brasileiros viram planos econômicos virarem o país de pernas para o ar em um canetaço, a moeda perder o valor de um dia para o outro, o sistema que deveria amparar o indivíduo entrar em curto-circuito, etc. Ambos conhecemos as peripécias de tentar entrar no clube dos ricos pela porta da frente, e sabemos que não é fácil.

Ao voarmos de volta ao Brasil, fomos recebidos com um sol radiante ao amanhecer. Paisagem colorida de novo! Não poderia haver fecho melhor para um mês de verão passado em meio ao inverno europeu. De agora em diante, castelo só de areia na beira da praia!!