Calcinha Azul Brilhante

 

por El Comanchero

 

Nas agruras da vida suburbana encontrei um porquê para minha existência. A calcinha da minha vizinha no varal. Ela não sabia. Mas todo dia quando ela saía para o trabalho e deixava as roupas no varal nos fundos de sua casa de madeira, eu, um desempregado, um inútil, um vagabundo, ficava ali, a observar sua calcinha. Um dia era branquinha, alvinha, límpida. No outro dia tinha desenhos com florzinhas e isso me deixava excitado. Um dia ela pendurou uma calcinha azul brilhante. Isso me deixou realmente puto. Calcinha azul. Brilhante. Saí de casa louco da vida e fui no boteco do Tadeu tomar uma canha.

- E aí, Tadeu, vê aquela!

Pago meus cinqüenta centavos e tomo num gole. Como era triste gastar o dinheiro da aposentadoria do meu pai, que ainda trabalhava de servente de obra na capital, em cachaça. Mas, fazer o quê? Era meu destino. Tomei mais dois tragos enquanto ganhei uma partida de pife de um velho que passava o dia inteiro ali perdendo partidas de pife. Pelo menos ele não perdia o tempo dele no bingo. Agora tomei bastante coragem. Voltei para casa, liguei a tevê. Estava passando Angelmix. Fiquei de pau duro e bati uma bronha quando apareceu a Sandi cantando, se bem que o Júnior já dava pra quebrar o galho. Na punheta. Fumei um só pra aliviar a pressão alta do corpo com o álcool da cachaça e fui pros fundos da casa. Minha mãe tinha ido visitar minha tia doente no Pronto Socorro. Ela estava na fila de espera do SUS. Bem feito! Quem manda a gente ser pobre e ainda ter doença de rico. Câncer. Que burrice! Encarei bem a calcinha azul brilhante. Como deveria ficar a vizinha, aquela mulatinha de perna fina, cabelo crespo comprido, bundinha arrebitada e peitinhos pequenos e duros. Ah! Eu já tô ficando louco. Tiro minha camisa, meus tênis All Stars roubados, minhas calças da Gang que ganhei na campanha da fraternidade e minhas cuecas rasgadas no rego de tanto lavar com clorofila no tanque. Agora era a hora. Tomei fôlego. Corri como um louco, pulei o muro e invadi o terreno da vizinha. Peguei a calcinha. Azul brilhante. E pulei outro muro. E outro muro. Me escondi em um terreno baldio onde os trafi da área de vez em quando desovavam mercadorias perigosas e cheirei aquela calcinha. Cheirei. Tinha o cheiro doce, cru, mal lavada que estava, cheirinho de buceta lavada. Cheirinho do inferno e do paraíso.

Agora não tem mais volta. Ninguém mais pode me salvar.

 

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